O sedentarismo relacionado a certas atividades profissionais tornou-se um problema de saúde pública, segundo a endocrinologista e fisiologista francesa Martine Duclos, chefe do setor de Medicina do Esporte do Hospital Universitário de Clermont-Ferrand, no centro da França. O mais preocupante, alerta, é que a prática regular de uma atividade física não elimina os riscos associados ao hábito de passar várias horas sentado por dia.
Taíssa Stivanin, da RFI em Paris
A rotina de quem trabalha em um escritório é geralmente sempre a mesma: acordar, tomar café, às vezes levar as crianças para a escola e em seguida ir para a empresa — de bicicleta, metrô, ônibus ou a pé. Mas, independentemente do meio de transporte, para todas essas pessoas é inevitável passar cerca de oito horas diárias sentadas.
Algumas têm sorte (e tempo) para se exercitar durante o expediente, mas estudos recentes mostram que isso infelizmente não basta para impedir os efeitos nocivos do sedentarismo que representa passar várias horas na mesma posição, digitando em frente ao computador, alerta a médica francesa.
As primeiras vítimas desse mau hábito são as artérias, que sofrem com a diminuição do fluxo sanguíneo. “Quando estamos sentados, os músculos das pernas não se contraem, e o fluxo do sangue diminui. Ele se mantém em certo nível, já que é necessário levar oxigênio aos músculos, mas é reduzido, o que diminui a pressão exercida nas paredes das artérias”, explica a fisiologista
As paredes arteriais são formadas por células endoteliais, que são estimuladas pela pressão do sangue circulante, levando à produção de um gás chamado monóxido de azoto (óxido nítrico). “O monóxido de azoto tem um efeito muito positivo nas artérias, pois induz a dilatação. Além disso, possui ação anti-inflamatória e inibe a agregação das plaquetas”, explica a endocrinologista francesa.
Ficar sentado, mesmo por poucas horas, reduz a produção desse gás benéfico e aumenta a produção de endotelina-1, uma substância vasoconstritora, ou seja, que estreita os vasos sanguíneos. Esse processo favorece o surgimento da hipertensão e da inflamação, afetando diversas funções orgânicas.
Sedentarismo afeta concentração, memória e atenção“Quando permanecemos sentados por muito tempo — duas ou três horas, por exemplo — há aumento da pressão arterial, da glicemia após a refeição e dos triglicerídeos, ou seja, da quantidade de lipídios no sangue, e uma redução da oxigenação cerebral. A capacidade de concentração, memória e atenção também diminuem”, alerta a especialista.
As consequências para a saúde podem ser graves, considerando que um adulto passa, em média, mais de 12 horas por dia sentado, ao longo de vários anos. Esse sedentarismo, segundo a fisiologista, está diretamente associado ao aumento do risco de obesidade, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, certos tipos de câncer, demência e morte prematura.
“Infelizmente, essa rotina faz parte do nosso estilo de vida, que é totalmente mecanizado. Saímos de casa, pegamos o carro, estacionamos no trabalho, usamos o elevador, sentamos, ficamos em frente ao computador, pedimos comida, comemos na frente da tela, pegamos o elevador e voltamos para casa. Passamos o resto do dia, geralmente, diante de uma tela. É simples: podemos passar o dia todo sentados.”
Como amenizar os efeitos dessa rotina nociva?Com o avanço da idade, as artérias tornam-se mais rígidas, e essas recomendações se tornam ainda mais importantes. Mas o risco do sedentarismo não poupa ninguém, nem mesmo pessoas saudáveis e fisicamente ativas, reitera. “O efeito negativo nas artérias está comprovado, mesmo na ausência de fatores de risco.”
Mas é possível agir para diminuir as consequências de ficar muito tempo sentado. Segundo a especialista, estudos mostram que reduzir em 30 minutos o tempo total sentado por dia, praticando uma atividade física moderada, pode diminuir a mortalidade em até 40%.
A redução é de 20% mesmo com atividades de baixa intensidade, como se levantar para beber água ou dar uma volta no escritório. Outra recomendação é não permanecer mais de uma hora sentado sem se levantar por alguns minutos.
Ela também alerta para soluções ineficazes adotadas por algumas empresas, como trabalhar em pé. “Ficar de pé, sem movimentar as pernas, não serve para nada.”
Por outro lado, a fisiologista recomenda o uso da pedaleira de escritório, um equipamento que pode ser colocado sob a mesa e utilizado enquanto se trabalha. O chamado "escritório ativo", com esteiras ou estações de movimento, também é uma boa solução.
Martine Duclos lembra que 30 minutos de atividade física leve, duas vezes por semana, já trazem benefícios à saúde cardiometabólica. “O mundo do trabalho precisa agir para enfrentar esse problema, pois é lá que passamos a maior parte do tempo sentados.”