
A cientista Miria Ricchetti, coordenadora do setor de Mecanismos Moleculares do Envelhecimento Patológico e Fisiológico do Instituto Pasteur, em Paris, explica como a ciência atua para identificar elementos, genéticos ou ambientais, associados às modificações celulares que ocorrem na terceira idade.
Taíssa Stivanin, da RFI em Paris
Em 2022, uma pesquisa divulgada pelo Instituto Nacional do Envelhecimento dos EUA (NIA) mostrou que descendentes de famílias longevas apresentavam taxas mais altas de sobrevivência e envelhecimento saudável do que a média da população. Eles teriam menor probabilidade de desenvolver doenças crônicas como diabetes, patologias cardiovasculares e demência, comuns na velhice.
O estudo, chamado Long Life Family Study (LLFS), acompanhou cerca de 5.000 pessoas de 539 famílias. A pesquisa mapeou fatores que contribuem para a longevidade, relacionados ao meio ambiente ou à genética. Os dados genômicos foram processados em centros especializados e sugerem a existência de variantes genéticas associadas à vida longa em boa forma física e mental.
“Longevidade significa viver com boa saúde, como resultado do nosso estilo de vida e dos nossos genes. Esse é, claro, um objetivo para todos nós. Todo mundo quer viver o maior tempo possível, com a melhor saúde possível”, diz Miria Ricchetti.
Mas será que a possível existência dessas variações genéticas seria a resposta que faltava para explicar por que algumas pessoas envelhecem com saúde e outras não? Não exatamente, segundo a cientista do Instituto Pasteur. “Não pense que amanhã os cientistas vão descobrir uma pílula mágica que fará com que você envelheça perfeitamente e chegue aos 100 anos deitado no sofá comendo batata frita”, brinca.
No estudo divulgado pelo instituto americano, o objetivo era identificar elementos genéticos e ambientais associados à longevidade. Para isso, os cientistas utilizaram um grupo de controle, formado por participantes com longevidade considerada normal. Os pesquisadores então mediram parâmetros essenciais para o envelhecimento saudável, como força muscular e memória.
Miria Ricchetti comentou a pesquisa a pedido da RFI e elogiou a metodologia aplicada pelos cientistas americanos. No entanto, ressalta que o envelhecimento é multifatorial e inclui a questão genética. Uma das dificuldades, segundo ela, é justamente entender o papel de cada elemento nesse processo, em nível individual.
Segundo ela, novos testes sanguíneos já são capazes de mostrar, por exemplo, a velocidade de envelhecimento dos órgãos de um indivíduo, que não ocorre de forma simultânea. “Vários estudos indicam que nosso corpo não envelhece de maneira linear. Todos nós temos pontos fortes e fracos”, salienta.
No futuro, será importante conhecer essas fragilidades individuais para melhorar a qualidade de vida na terceira idade. “Não há mais dúvidas de que a genética e o meio ambiente atuam em conjunto na maneira como envelhecemos. O que não sabemos exatamente é em qual proporção esses fatores influenciam”, reitera.
"São três fatores que estão envolvidos no envelhecimento: a genética, o meio ambiente e a interação entre eles", reitera. O maior risco, lembra, continua associado às predisposições genéticas combinadas com um estilo de vida inadequado.
Envelhecimento celularO que acontece nas células quando envelhecemos? "Durante o envelhecimento, o número de células senescentes aumenta. Não sabemos se isso ocorre porque há mais células desse tipo, se elas não são eliminadas em quantidade suficiente, ou ambos”, explica a pesquisadora.
Células senescentes são aquelas que deixam de se renovar, mas não morrem. Esse processo é uma resposta natural a diferentes tipos de estresse celular.
Outro fator importante nas etapas que influenciam o envelhecimento é o estreitamento dos telômeros, estruturas localizadas nas extremidades dos cromossomos que protegem o material genético durante a divisão celular. Com o tempo, os telômeros se desgastam, levando à senescência ou à morte celular.
Outros elementos incluem a estabilidade genômica, o metabolismo, entre outros. O processo, em termos moleculares, ainda não foi totalmente explicado pela ciência, ressalta Miria Ricchetti.
Doenças raras podem trazer respostasUma das pesquisas coordenadas pela cientista envolve doenças que aceleram o envelhecimento, como a síndrome de Cockayne (CS), causada por uma mutação genética rara que torna os pacientes hipersensíveis à luz.
As causas da degeneração celular e do envelhecimento precoce, mesmo quando os pacientes estão protegidos da exposição solar, ainda são desconhecidas. “Tentamos entender o que ocorre com essas pessoas que, na maioria dos casos, aparentemente nasceram normais”, explica.
A equipe agora se dedica a estudar três casos no mundo em que os pacientes, apesar de apresentarem mutações semelhantes, não desenvolvem envelhecimento precoce. “Estamos muito interessados nesses casos, porque essa resistência está relacionada a fatores de proteção”, conclui.