“O Agente Secreto”, de Kleber Mendonça Filho, estreou neste domingo na competição oficial do Festival de Cannes. A equipe do longa, protagonizado por Wagner Moura, chegou ao tapete vermelho embalada por um bloco de frevo. O filme foi aplaudido com entusiasmo por vários minutos após a exibição e jà é citado como um forte candidato à Palma de Ouro.
Adriana Brandão, enviada especial da RFI a Cannes
“O Agente Secreto” se passa em Recife, em 1977, e explora as tensões políticas da época da ditadura militar brasileira. Essa é a primeira colaboração entre Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura. O diretor e ator concederam juntos uma entrevista à RFI em Cannes.
Para Wagner Moura, foi “libertador” voltar a atuar em português. Ele ficou muito feliz nas filmagens e com a colaboração inédita com Kleber Mendonça. Segundo o ator, “Agente Secreto” é um filme “absolutamente brasileiro”.
“Kleber transforma as referências dele em algo absolutamente brasileiro, de uma forma única. Quer dizer, é um cinema de gênero, que não foi inventado no Brasil, mas é um filme totalmente brasileiro. Isso faz com que esse filme seja um filme original, forte, potente, especial”, elogia Moura.
O cineasta pernambucano, afirmou que fez uma crônica de uma época. “É uma crônica em longa-metragem de um momento da história do Brasil que eu pessoalmente ainda lembro, porque eu era uma criança, mas, ao mesmo tempo, eu acho que tem muita pesquisa histórica”, afirma. O cineasta acredita que o filme fala de “resistência” porque mantém o “olhar na realidade”.
HistóriaA trama acontece “em uma época cheia de pirraça” aponta uma legenda no início do filme. O longa segue o retorno do professor universitário Marcelo (Wagner Moura) a Recife. Ele busca documentos oficiais da mãe, uma adolescente, doméstica de origem indígena, engravidada pelo filho da família de senhores de engenho.
Marcelo também quer se reencontrar com o filho e fugir do Brasil, pois descobre que está marcado para morrer. Pessoas são assassinadas, corpos jogados em represas e rios. Uma perna é descoberta dentro de um tubarão, ganha vida e volta para se vingar. As citações de filmes da década de 1970 são inúmeras, sendo a mais explícitas dela a referência a “Tubarão”, de Steven Spielberg.
O longa é uma combinação de filme de espionagem, thriller político, pastiche, relato pessoal e elementos surreais. Explora temas de resistência, identidade e memória. “O Agente Secreto” tem vários elementos característicos da obra de Kleber Mendonça Filho.
Ele é realizado após “Retratos Fantasmas”, também selecionado em Cannes em 2022, fora da competição. Os dois longas foram rodados nos mesmos locais, e abordam a questão da memória, resistência, diálogo com a história do cinema, e têm ambos três partes.
O “Agente” seria uma continuação. “Eles têm a mesma alma, eu diria, porque são dois filmes muito repletos de imagens guardadas, mas eles não poderiam ser mais distintos”, acredita.
Filme políticoWagner Moura, diretor de “Marighella”, também aborda a questão da memória e da história do Brasil em sua obra. Ele salienta que gosta de filmes políticos, mas diz que “O Agente Secreto”, é um “filme político diferente”.
“O meu filme ‘Marighella’ é ostensivamente confrontador. Esse é um filme sobre pessoas que vivem numa situação tão louca, de valores tão distópicos que, como o Kleber fala, dizer que a ‘água é molhada’ soa como uma coisa comunista”, pontua.
“O Agente Secreto” marca a terceira participação de Kleber Mendonça Filho na disputa pela Palma de Ouro, após Aquarius (2016) e Bacurau (2019), e a quarta na seleção oficial. A seleção do longa reforça a presença e o prestígio do cinema brasileiro no cenário internacional, depois do Oscar histórico de “Ainda Estou Aqui”, que também aborda o tema da ditadura.
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