A menos de cinco meses da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que acontece novembro em Belém, o secretário extraordinário para a COP30, Valter Correia da Silva, corre contra o relatório para que o evento o meio da Amazônia seja inesquecível de maneira positiva. Otimista, ele reconhece os desafios, mas afirma que a capital paraense será outra depois da convenção. Sobre hospedagem, um dos grandes nós no horizonte, diz que a questão será equacionada e que os preços de leitos estarão dentro do razoável.
Vivian Oswald, correspondente da RFI em Brasília
Em entrevista ao RFI Convida, Valter Correia da Silva afirmou que os donos de imóveis e hotéis estão "caindo na real", que num primeiro momento existiu o que chamou de "alucinação coletiva”. Capitaneado por ele, o governo está mapeando os leitos disponíveis e a ideia é que ninguém deixe de ir por causa dos custos.
Isso é o que pretende dizer em Bonn, na Alemanha, onde as 190 delegações que estarão em Belém se reúnem na SB 62, a última grande reunião do clima da ONU antes da COP30.
Correia afirma que há várias frentes em que o governo tem trabalhado desde o ano passado. Ele esteve recentemente em Belém, onde passou uma semana, para mapear a cena da hospedagem.
Entre as opções, haverá as vilas militares, que, na verdade, são espaços que militares utilizam para pernoites, e que estão sendo reformadas há quase um ano e devem abrir 1.600 leitos. O governo federal acaba de assinar com um ator imobiliária de Belém um termo de compromisso para garantir transparência e ética na oferta de imóveis durante a COP30.
"Radiografia" do setorO secretário quer uma "radiografia" do setor para ter um mapa da real demanda que ainda precisa ser atendida.
"Temos escolas que estão sendo reformadas, que vão disponibilizar 5.000 leitos. Temos os navios que estão na fase final de contratação. Já contratamos a Embratur, que está em fase final de contratar a operadora, que por sua vez contrata os navios. Acredito que mais uma semana, duas no máximo, já tenhamos os navios praticamente contratados”, afirma Correia da Silva.
Esses navios vão ficar um pouco mais afastados. Não ficarão na Estação das Docas, como previsto inicialmente, porque o calado não preparado. A dragagem não deu certo. "E a gente acabou indo para um porto próximo, que é Outeiro. Mas ali precisa de uma reforma, que já começamos. Já está num estágio bastante alucinado de obras ali”, diz.
"Praticamente estamos construindo dois píeres novos. Estamos reformando e construindo um novo para poder atracar esses dois navios, com calados mais do que suficientes para esses dois navios, e, eventualmente, até para um terceiro se a gente conseguir contratá-lo”, explica.
Os dois navios devem oferecer seis mil leitos no total. Para aproximar quem vai se hospedar neles da área da convenção, está sendo construída uma ponte, que deve ser entregue em agosto, pelo governo do estado e uma pista de BRT.
“O BRT está em fase final. Vamos fazer uma linha direta do navio até o local do evento. Vai dar ali em torno de 25, 30 minutos no máximo, com os ônibus que a gente vai colocar à disposição para levar todo esse pessoal que tiver no navio”, conta, lembrando que até motéis estão disponíveis para acomodar as pessoas nesse período. "Achamos que vai ser suficiente”, garante.
Ofertas de imóveis e plataforma de reservasA oferta em imóveis privados continua crescendo, segundo ele. Passou de 600 imóveis que normalmente se colocava disponível nas plataformas para mais de 5.000. Correia acredita que os preços exorbitantes vistos até aqui começam a diminuir, embora muitas pessoas continuem se queixando da falta de oferta e dos valores muito acima do que se poderia imaginar.
"Já temos uma pesquisa que aponta que já está diminuindo os valores desses imóveis. Significa que as pessoas, num primeiro momento, testaram, para ver se conseguiam um valor maior, e, vendo que não conseguem alugar por esses preços, estão diminuindo. Mesmo assim ainda está alto”, destaca.
O secretário extraordinário para a COP30 afirma que tem feito uma investida junto às plataformas e às imobiliárias. "Estamos fechando um acordo com eles também, de não aceitarem imóveis acima de um patamar considerado razoável por eles próprios. Eles sabem o que é razoável. Não é razoável você pedir centenas de milhares de reais para alguns dias num imóvel que não vale nem aquele valor que está sendo pedido”, diz.
"As pessoas estão caindo na real também. Aconteceu em outros países também onde foi realizada a COP. Isso é um primeiro momento, daquela alucinação coletiva. Depois as coisas vão entrando no seu normal”, acrescenta. Ainda há vários hotéis em construção, segundo lembra o secretário.
"Fui visitar três hotéis em construção que eu nem sabia que existiam. Todos eles juram por Deus que vão terminar em tempo hábil para poder entregar. Inclusive, nós estamos fazendo algumas tratativas para ver se já entra num preço também considerado razoável com esses hotéis”, disse. O governo também se prepara para lançar uma plataforma, que deve organizar a oferta e demanda de quartos na cidade.
"E essa plataforma começa agora a trabalhar para ver o que consegue colocar. Temos um hotel que está sendo construído pelo governo do estado, com recursos da binacional Itaipu, que depois vai servir como sede administrativa. Nós vamos ter ali 400 apartamentos que vão estar disponíveis para essa plataforma também”, explica ele.
Valter Correia da Silva destaca que a oferta será priorizada para as delegações, sobretudo aquelas que dispõem de menos recursos para participar. Mas a logística não se restringe apenas a quartos de hotel. Gente de dentro do governo e das delegações se queixam da falta de serviços na quantidade necessária para dar conta de evento que deve levar uma média de quase 30 mil pessoas por dia à cidade. Há informações sobre a dificuldade de encontrar serviços de catering e até de fotocópias.
"Isso é um exagero. Tão exagerado quanto o preço da hoteleira. Dizer que não tem catering lá… Tem uma culinária maravilhosa. É uma das melhores do país, tá certo? Muito elogiada. Nós temos lá o Círio de Nazaré, todo ano, com dois milhões de pessoas, e ninguém deixa de se alimentar, ninguém deixa de beber água. É uma capital. Tem as suas limitações, como várias outras capitais no Brasil. Mas é uma capital”, contesta Correia.
O secretário nega que a pré-COP, evento que acontece sempre um mês antes da convenção, vá acontecer em Brasília por conta da falta de estrutura em Belém. "Está sendo feito em Brasília por uma questão de comodidade, não porque não poderia ser feito lá em Belém, porque coincide também com o Círio”, afirma.
Legado para BelémCoreia reconhece que ainda é preciso equacionar as questões estruturais, o que está sendo fazendo. "Estamos trabalhando muito fortemente nisso e acredito que ela vai ser inesquecível pelo lado positivo. Tenho muita convicção em relação a isso. Não consigo imaginar um fracasso ou algo que possa torná-la inesquecível de uma forma negativa. Estou muito otimista. A minha equipe toda está otimista", garante. Tudo isso, segundo ele, deve deixar um grande legado para a cidade, que já vem registrando aumento no turismo de negócio e de turismo de lazer.
"Se você quiser pegar um hotel lá no meio da semana vai ter dificuldade. Não é qualquer semana, em qualquer momento. Está se tornando uma coisa já corriqueira. Nós achamos que, por exemplo, são muitos legados. Só a canalização, saneamento que está sendo feito está atingindo mais de 600.000 pessoas, a metade da população de Belém”, diz.
O governo federal vai gastar em torno de R$ 4,5 bilhões com os preparativos e obras de infraestrutura. Segundo Correia. O porto que está sendo reformado para receber os navios será um dos grandes legados deixados pela COP30 para o desenvolvimento local. "Eles vão poder aportar os navios, não só de carga, mas também para mais cruzeiros, em época de Círio, em época de outros momentos. Turismo tanto de negócios quanto de lazer, não só para Belém, para toda a região norte. Isso que está sendo feito hoje em termos de estrutura da rede hoteleira vai permanecer sendo bastante ocupada e bastante utilizada”, afirma, lembrando que as obras estão mudando a cara de Belém.
"Ela vai ser uma outra capital depois da COP. O legado vai ser muito grande. A ideia é terminar todas as obras. E todas estão dentro do cronograma. A gente acompanha, faz ponto de controle, tanto como prefeito quanto com o governo, estão todas dentro do cronograma”, destaca.
Só de capacitação de profissionais já foram mais de 20.000 para a rede hoteleira e restaurantes. Em novo edital, o governo agora quer atrair voluntários. Serão mais de 3.000 pessoas. A preferência será data aos locais, de Belém e do entorno, até para não pressionar ainda mais a infraestrutura trazendo gente de fora. Serão pessoas de todas as idades. Tem algumas restrições. Para algumas determinadas atividades, o inglês é básico.
"Vai ser um edital bastante plural. Vai ter para todas as faixas, para todos os tipos de pessoas. Normalmente são jovens que se inscrevem, o pessoal da universidade, primeiro emprego. Mas em Baku eu vi bastante gente de terceira idade também e atuando muito bem”, afirma.
Estrangeiros estariam fora num primeiro momento, mas podem ser aceitos se for necessário ampliar as contratações. Sobre o movimento "made in Pará”, que segue forte do estado acompanhando os embalos da COP30, o secretário afirma que o governo tem feito uma curadoria do que será mostrado, mas com ao cuidado de não atrapalhar as negociações.
"Estamos fazendo essa curadoria agora, sempre procurando não tornar a COP um evento popular no sentido de festa, de festividade. Não é isso. É um momento muito sério. Isso todo o governo tem falado. O presidente da COP, a própria Marina Silva tem falado isso. Não é um momento de grandes festividades. É um momento de muita tensão, de muita negociação, de muita concentração”, enfatiza.