Cinco filmes paulistas na programação do Mercado do Filme do Festival de Curta-metragem de Clermont Ferrand serão exibidos em uma sessão especial para o público nessa quinta-feira, 6 de fevereiro, no centro da França. O evento francês é o maior do mundo para produções neste formato e reúne, todos os anos, um público fiel e interessado na criação brasileira.
A seleção dos curtas apresentados no centro da França foi definida por Anne Fryzsman, programadora internacional do Festival de Curtas de São Paulo – Kinoforum. Ao lado do coordenador Marcio Miranda Perez, Anne dá continuidade ao trabalho iniciado há décadas pela diretora da mostra paulistana, Zita Carvalhosa, que abriu as portas do mercado global de produtores e distribuidores aos cineastas brasileiros.
"A seleção foi feita em cima de filmes paulistanos de 2024 – alguns estavam em fase de finalização –, e de 2025, porque estávamos à procura de filmes recentes. Queríamos mostrar a vivacidade e a diversidade do curta-metragem brasileiro", disse Anne em entrevista à RFI.
Duas produções vieram da Rede Afirmativa, da Spcine. Quase Trap!, um filme de iniciação, dirigido por Filipe Barbosa, conta a história de um menino da periferia de São Paulo absorto pela questão da virilidade na adolescência. Anastácia, de Lilih Curi, aborda a violência doméstica. Já 2 Brasis, de Carol Aó e Helder Fruteira, é um filme de ação e uma distopia, com uma produção bem trabalhada, enquanto Carlinha e André, de Ricky Mastro, retrata a história de amor de uma senhora transgênero que está esperando a volta do marido para casa, depois dele ter revelado a ela que estava com Aids. Por fim, Migué, de Rodrigo Ribeyro, vencedor do prêmio Revelação no festival de curtas de São Paulo no ano anterior, conta a história de uma garota paulistana trabalhadora que resolveu tirar um dia de folga.
"A gente queria mostrar filmes que conversariam internacionalmente e também mostrar um certo panorama de gênero, com diretores mais velhos e outros mais novos", explica Anne Fryzsman.
Além dos curtas do programa elaborado pelo Kinoforum, com o apoio da Spcine, do Instituto Guimarães Rosa e da Embaixada do Brasil em Paris, três curtas brasileiros concorrem a prêmios na competição internacional do festival: Amarela, de André Hayato Saito; Jacaré, de Victor Quintanilha; e Eu Sou um Pastor Alemão, de Angelo Defanti, na categoria animação.
Curtas brasileiros já foram aplaudidos de péTodos os anos, o festival de curtas francês transforma a vida dos moradores de Clermont Ferrand, ao acolher a nata internacional de diretores, jovens cineastas, produtores e distribuidores. Desde cedo, a Casa da Cultura, um imponente edifício no centro da cidade, oferece uma programação extensa de filmes em grandes auditórios, que lotam rapidamente com um público fiel e impregnado pela cultura do curta-metragem.
Mais de dez salas espalhadas pela cidade acolhem as seleções in e off do festival, ao mesmo tempo em que jornalistas do mundo todo acompanham as apresentações e ficam no vaivém entre a Casa da Cultura e o Mercado do Filme, realizado em um edifício adjacente.
Os filmes brasileiros costumam gerar expectativa positiva, uma vez que vários deles marcaram o público e profissionais do setor.
"Eles lembram que os maiores sucessos de público foram brasileiros. Ilha das Flores [curta de Jorge Furtado, 1989] ganhou o prêmio do público em 1991 e sempre está numa retrospectiva. Quando um produtor recebe uma carta branca, ele vai querer mostrar Ilha das Flores", conta Anne Fryzsman.
O curta de Jorge Furtado faz uma crítica ácida do capitalismo, ao narrar a trajetória de um tomate, desde o seu plantio até o seu descarte na Ilha das Flores, local que abrigava um lixão de Porto Alegre, onde cerca de 500 toneladas de lixo por dia eram despejadas na época e vasculhadas por pessoas famintas.
"Mais recentemente, tivemos um outro filme brasileiro que ganhou o prêmio do público, que era Meu Amigo Nietzsche [Fáuston da Silva, 2012]. No final do filme, na sala onde ele foi exibido, que é a maior do festival, com 1.400 lugares, estavam todos em pé cantando. Foi uma coisa inacreditável", recorda Anne.
Desta vez, Zita Carvalhosa, iniciadora dessa história de admiração dos franceses pela criação brasileira em Clermont Ferrand, não veio à França. Ela acompanha à distância o trabalho de promoção que faz há anos para divulgar o curta-metragem brasileiro no exterior. Essa dedicação tem resultados concretos com os prêmios conquistados pelo cinema nacional e o acolhimento caloroso do público.