Paris e Argel longe de um entendimento após intervenção da Alemanha na libertação de Boualem Sansal
14 November 2025

Paris e Argel longe de um entendimento após intervenção da Alemanha na libertação de Boualem Sansal

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O escritor franco-argelino Boualem Sansal foi libertado esta semana e está de regresso à Europa, após ter sido condenado a cinco anos de prisão por atentar contra a unidade nacional na Argélia. Sansal é crítico do regime argelino e acabou por ser apanhado entre o fogo cruzado diplomático entre Paris e Argel. A sua libertação foi facilitada pela Alemanha, especialmente pelo Presidente Steinmeier, como explicou o jornalista e especialista em países africanos, Rui Neumann, em entrevista à RFI.

O escritor franco-argelino Boualem Sansal foi libertado esta semana após ter cumprido um ano de prisão na Argélia, tendo sido originalmente condenado a cinco anos de prisão por atentar contra a unidade nacional. Bansal tornou-se um dos danos colaterais da deterioração da relação entre Paris e Argel, com a Alemanha a ter de intervir de forma a facilitar a libertação do escritor.

Em entrevista à RFI, o jornalista e especialista em países africanos, Rui Neumann explicou a importância do papel da Alemanha na libertação de Boualem Sansal e as dificuldades entre Paris e Argel.

"A mediação da Alemanha sem dúvida que teve um peso muito importante, porque as relações entre a Argélia e a França podem caracterizar-se como múltiplas reconciliações que acabam sempre em súbitas rupturas. Portanto, desde 1962, há uma relação muito tumultuosa entre a França e a Argélia, que neste momento está numa situação muito crítica. O Presidente alemão não é uma figura conhecida em França e na Argélia também não. [...] Há uma relação pessoal muito forte com o presidente argelino Abdelmadjid Tebboune. E isto aconteceu no período do covid em que o Presidente argelino ficou gravemente doente com o covid e foi tratado na Alemanha, numa logística que foi muito organizada pelo Presidente alemão. E aqui houve laços que se estabeleceram, laços pessoais e até mesmo políticos. Apesar da limitação que tem o próprio presidente alemão. Portanto, quem beneficiou, de certa forma foi a França, com a libertação de Boualem Sansal. Mas, por outro lado, mostra também a grande fragilidade da França na resolução de diferendos diplomáticos e, neste caso, para a libertação de Sansal. Lembro também que ainda há um jornalista francês que está detido na Argélia, o Christophe Gleizes, que para já, ainda não existem indícios da sua libertação", explicou o jornalista.

Um dos mais recentes pontos de discórdia entre Paris e Argel é o apoio da França ao processo de autonomia do Sahara Ocidental proposto por Marrocos e entretanto aprovado no Conselho de Segurança das Nações Unidas, já que a Argélia apoia a Frente Polisario que é pela independência deste território.

Mesmo com a aprovação desta resolução, Rui Neumann não acredita que se esteja mais perto da resolução deste conflito que dura desde 1975 - o fim da colonização espanhola -, sendo actualmente o único território do pós-colonial no continente africano sem estatuto definido.

"Quando conhecemos bem a Frente Polisário e os seus dirigentes, obviamente que não vão baixar as armas. Quando eu digo as armas, são as armas no sentido bélico da expressão, mas também no sentido político, aqui há um posicionamento principalmente do Conselho de Segurança da ONU, em que se, digamos, de uma forma quase ambígua, se posiciona ao lado do plano da autonomia marroquino, em que considera que é o plano mais credível para o Sahara Ocidental. Há sempre a Argélia, o grande pilar de apoio da Frente Polisário. E eu recordo que a Frente Polisário é reconhecida pela própria ONU como a única organização que tem legitimidade histórica para representar a população sarauí. Não falamos de uma resolução, mas de instrumentos de enorme pressão contra a Frente Polisário para aceitar não o plano que propõem Marrocos, mas um outro cenário negociado", detalhou Rui Neumann.

 

O plano marroquino visa fazer do Sahara Ocidental uma região autónoma, com mais poderes para autoridades locais e a gestão do seu próprio orçamento, guardando para Marrocos a capacidade de impor a sua bandeira, a moeda e ainda outras capacidades constitutivas do Estado como as relações internacionais, a defes ae a segurança.

A Frente Polisário disse que até poderia aceitar esta opção, mas só se ela fosse a referendo e aprovada pelos cerca de 600 mil habitantes do Sahara Ocidental.