Na semana passada, no dia 13 de Agosto, um grupo de habitantes de vários bairros da cidade de Moatize, na província de Tete, no norte de Moçambique, dirigiu uma carta às autoridades locais e à empresa de mineração Vulcan, estabelecendo o prazo de 30 dias para que sejam tomadas medidas contra a poluição provocada pela exploração do carvão por esta entidade na região.
Os autores da carta que referem reservar-se "o direito de tomar todas as medidas legais de protesto e de tutela efectiva dos seus direitos individuais e colectivos" se nada for feito, queixam-se de estar mergulhados em poeiras de carvão, por causa das actividades da Vulcan que, segundo ONGs no terreno, trabalha cada vez mais perto das comunidades locais.
A problemática do impacto ambiental da exploração do carvão em Moatize não é de hoje. A brasileira Vale explorou a mina durante uma dezena de anos até cedê-la por cerca de 253 milhões de Euros à mineradora de capitais indianos Vulcan em finais de 2021. Durante a época em que a Vale explorou a mina, houve nomeadamente denúncias de poluição da água com impacto na saúde da população mas também nas actividades económicas locais.
Contudo, segundo Pinho Pires, membro da Rede Africana Juvenil em Moatize, a situação tem vindo a piorar desde que a mina está a ser explorada pela Vulcan. Ao descrever o cenário actualmente vigente na região, o activista social que tem dado apoio às comunidades afectadas pela poluição, mostra-se céptico quanto à resposta da Vulcan e das autoridades locais.
"O principal problema é a poluição mesmo do ar. Há muitas poeiras que acabam afectando as comunidades. A mineradora está mais próxima das comunidades. Então toda a operação que se faz dentro da mina, todas as poeiras dela se estendem para as comunidades", refere o activista ao explicar que neste contexto, "não se consegue deixar a roupa fora, não se consegue consegue deixar a água fora, deixar a farinha branca fora, assim como os outros utensílios domésticos" e que as partículas entram inclusivamente nas casas, mesmo fechadas. "A comunidade é obrigada a fazer sempre limpeza em circunstâncias em que o distrito não tem água" e "outro problema são as detonações que criam problemas, por exemplo, de habitação, rachas, infiltração, às vezes desabamento mesmo", descreve ainda Pinho Pires.
Para além do impacto ambiental, o activista também detalha os problemas provocados pela actividade de mineração na saúde da população de Moatize. "Não há pesquisas muito maiores pelas quais possamos ter evidências em relação à saúde, mas pelos vistos temos muitos problemas ligados à respiração, constipação, problemas de gripe. E as pessoas que sofrem já de asma acabam sendo mais vulneráveis", refere o membro da Rede Africana Juvenil ao explicar que "as comunidades locais não têm condições de sair de um lugar para outro".
Questionado sobre o período que antecedeu a chegada da Vulcan na região há dois anos, Pinho Pires considera que "agora está pior", o activista referindo que enquanto a Vale esteve a explorar a mina, "já se estava a minimizar a situação, já se estavam a usar novas tecnologias para reduzir os impactos".
Ao explicar que a população tem tentado fazer chegar as suas reclamações à Vulcan através das autoridades moçambicanas, Pinho Pires diz que a população local acha que elas "não têm uma decisão forte sobre isso" e que "não há nenhuma actuação, nenhumas sanções, não acontece nada."
Perante esta situação, a RFI tentou contactar a Vulcan que até ao momento não deu resposta às suas solicitações. Na sua página internet, a empresa que sublinha ter sido em 2023,"pelo segundo ano consecutivo, o Maior Exportador de Grandes Projectos", comunica também sobre a sua responsabilidade social e ambiental. Destaca as actividades que tem desenvolvido a favor da agricultura local, a segurança alimentar, o abastecimento de água, a reciclagem de materiais descartados pelas suas estruturas, o seu programa de gestão do ruído e vibrações, ou ainda o apoio às franjas mais vulneráveis da população da zona de Moatize.
Ao ser questionado sobre a situação vigente no terreno, Eugénio Muchanga, administrador de Moatize, diz que efectivamente existem acções efectuadas pela Vulcan, mas que não são suficientes. O responsável local que reconhece a existência de poluição, confirma ter recebido a carta dos moradores descontentes e garante estar a envidar esforços para resolver o problema.
"O que posso dizer é que realmente a carta chegou às nossas mãos. É uma preocupação real que nós já vínhamos tratando com a Inspecção Geral das Minas que faz a vistoria dos níveis da poluição de ar. Esse trabalho está sendo feito nesse momento. Recebemos a carta e as entidades competentes estão trabalhando nisso. Mas é verdade que há poluição", começa por admitir o responsável local para quem é preciso insistir sobre "a questão do controlo das emissões de gases resultantes da mineração".
Inquirido sobre a qualidade da água que tem sido um dos problemas apontados pelos residentes nestes últimos anos, o representante das autoridades moçambicanas informa que tem havido algumas acções desenvolvidas mas que ainda não é o suficiente. "Neste momento temos um projecto que está a finalizar o abastecimento de água para a cidade de Moatize e para a cidade de Tete. A probabilidade de abastecimento ficar completo está para os finais de Setembro, segundo os dados que nós temos", indica o responsável político.
Por fim, ao sublinhar que a cidade de Moatize "não seria o que é, mesmo em termos económicos, sem o valor do imposto que (a Vulcan) paga ao Estado e retorna para a cidade", Eugénio Muchanga considera que a partir dos "conhecimentos que tem sobre mineração, sempre haverá problemas ambientais e de poluição".