A Assembleia legislativa do arquipélago português dos Açores aprovou a 17 de Outubro a criação daquela que seria a maior área marinha protegida do Atlântico Norte.
Numa altura em que a COP16 decorre até 1 de Novembro na cidade colômbiana de Cali, a Conferência das partes da ONU sobre biodiversidade.
Na perspectiva da meta de 2030, até essa data os territórios dispersos pelo mundo deveriam avançar com planos de áreas protegidas até 30% da respectiva superfície.
Foi neste contexto que o arquipélago português dos Açores acaba de aprovar um dispositivo criando um parque marítimo tido como o maior do Atlântico Norte.
Uma área de 300 000 kms2 que deve garantir a preservação de cadeias de montanhas subaquáticas e de ecossistemas marinhos vulneráveis, incluindo corais de águas profundas, fontes hidrotermais e espécies marinhas.
Bernardo Brito e Abreu é conselheiro para assuntos marítimos do governo regional dos Açores. Ele começa por apresentar este dispositivo que tem dado nas vistas à escala internacional.
O nosso Parlamento da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores aprovou o novo Parque Marinho e, portanto, estamos a falar não de uma área marinha, mas de uma rede de áreas marinhas que formam o Parque Marinho e que protege legalmente 30% de Zona Económica Exclusiva nacional em redor do arquipélago. Portanto, estamos a falar de 30% de quase 1 milhão de quilómetros quadrados de mar, o equivalente a uma rede com 287.000 quilómetros quadrados e, portanto, no Atlântico Norte neste momento não existe uma rede tão grande.
Devo salientar que o nível de protecção desta rede só terá, pelo menos dentro da Zona Económica Exclusiva. Só terá áreas marinhas de protecção ou não é permitida qualquer actividade extrativa e áreas marinhas protegidas de proteção elevada. Portanto, apenas algumas artes de pesca mais selectivas é que são autorizadas e em toda a rede, as actividades que não são extractivas: marítimo ou turística ou a ciência todas são reguladas.
Esta rede também cumpre com os "standards internacionais" da IUCN [União internacional para a conservação da natureza]. Neste momento, os líderes mundiais estão reunidos na Colômbia, em Cali, na COP 16, na Conferência das Nações Unidas para a Biodiversidade, a discutir exactamente como vamos proteger 30% do nosso território terrestre e marítimo.
E neste momento, os Açores, cerca de seis anos antes do limite, já o fizeram dentro da sua competência político-administrativa. Eu devo salientar que a designação das áreas marinhas é um primeiro passo de um processo que, normalmente, é mais longo até estas áreas estarem efectivamente geridas.
E, portanto, este diploma que os Açores aprovou portanto além do Parque Marinho e das novas áreas marinhas, também define um quadro legal muito concreto, com medidas e prazos bastante específicos para que esta implementação seja feita num espaço de tempo curto.
Para não designarmos estas áreas, e que elas apenas existam no papel e, portanto, os próximos passos legais que têm de ser feitos são, nomeadamente, a definição de uma estratégia e de um plano de acção, de estratégia e de gestão. Estas áreas têm que ter todas planos de gestão e planos de ordenamento. E temos mais outra etapa, que é a revisão das áreas marinhas costeiras.
Parque Marinho neste momento apenas engloba as áreas marinhas que são longe de terra. Portanto, nós temos uma outra série de áreas marinhas mais pequenas junto à costa, e essas terão de ser revistas e incluídas nesta rede até três anos, a partir da entrada em vigor.
Isto vai mexer, portanto, com a Guarda Costeira com biólogos, para que esta execução ocorra com a celeridade a que faz referência ?
Todo este processo que foi agora aprovado, decorre de um processo bastante longo, com cerca de cinco anos, em que se começou o programa "Blue Azores", que é uma parceria do Governo Regional que lidera o programa com dois parceiros, a Fundação Oceano Azul e o Instituto Waitt que, no fundo, serviu para acelerar um processo de revisão das áreas marinhas.
Os Açores têm um grande histórico de criação de áreas marinhas protegidas, têm um grande histórico de investigação científica na Universidade dos Açores, e no Departamento de Ocenografia e agora a parte de investigação materializa-se no Instituto Okeanos.
E, portanto, já há um longo... de mais de quatro décadas de investigação e de criação de áreas marinhas protegidas. E, portanto, este programa, no fundo, veio acelerar este processo para que os Açores tenham conseguido neste momento, dar este passo seis anos antes da data limite.
E porquê? Porque os Açores contêm no seu mar uma grande diversidade de ecossistemas vulneráveis, uma grande riqueza de biodiversidade e, portanto, a cada ano que passa o oceano degrada-se. Temos três grandes ameaças: as alterações climáticas, a poluição e a perda de biodiversidade pela exploração intensiva dos recursos. E, portanto, isto globalmente !
E, portanto, os Açores não só têm esta noção que temos que agir com urgência devido à questão ambiental, mas também porque vêem no mar um grande activo, porque com cerca de 1 milhão de quilómetros quadrados de área de jurisdição nacional [portuguesa] à volta do arquipélago, consideramos que o mar é um dos nossos maiores activos. E queremos que a nossa abordagem económica e de aproveitamento dos recursos não seja apenas extractiva.
E queremos impulsionar e queremos, de certa forma, liderar pelo exemplo a nível internacional, que podemos ter uma abordagem económica ao mar de uma forma sustentável, uma verdadeira economia azul, em que evolui de uma abordagem puramente extractiva para uma abordagem de valorização da natureza. Tivemos este exemplo há algum tempo, quando deixámos nos anos 80 de caçar baleias e hoje em dia temos o sector turístico muito promissor de observação de baleias.
No entanto, isso só se obteve aquando da adesão de Portugal à União Europeia. Sabemos que hoje há Museus da Baleia. O Pico São Jorge, nomeadamente, ficaram muito ligados a este último resquício da caça da baleia na Europa. Mas, obviamente, falando da parte extractiva, há muitas comunidades piscatórias nos Açores, não só na ilha de São Miguel, mas também. Tem noção de como é que se poderá antever de alguma forma, o impacto desta área no que diz respeito ao facto de que a pesca será regulamentada ainda mais do que actualmente ?
Sim, sim, este processo foi longo, portanto, como lhe disse, o programa já tem cinco anos, mas nos últimos dois anos intensificamos esta parte final e a rede que hoje temos, ela decorre de um processo participativo com os vários utilizadores do mar. Não apenas o sector da pesca, mas todos as entidades que têm ou atividade económica ou competências no mar e, sobretudo na região oceânica, portanto offshore, não as costeiras, porque esta rede que foi agora redefinida são áreas oceânicas.
E, portanto, nós fizemos em 18 meses mais de 40 reuniões com cerca de 17 entidades com competências ou interesses no mar. E, além disso, temos um longo período de consulta pública de apresentações e, portanto, o produto final desta rede é bastante participado e teve como base a ciência. Portanto, foi a ciência que nos indicou que zonas que activos é que existiam e onde é que eles estavam.
E sim, nós temos uma noção bastante detalhada do impacto de cada área. Até vai ter em cada segmento da frota pesqueira, porque aqui estamos a falar da pesca como um todo, porque temos actividades de pesca muito selectiva em algumas áreas, nomeadamente no atum, na pesca do atum que é feito através da arte salto e vara, que é bastante selectiva e que até será permitida nas áreas marinhas de protecção alta.
E depois temos obviamente as artes de pesca menos selectivas e com mais danos colaterais ou com mais pesca acessória, essas sim vão ser mais penalizadas por isso.
Temos dois tipos de mecanismos: um imediato, para quando entrarem em vigor este decreto regulamentar, que será um mecanismo de apoio a compensações aos pescadores, mecanismo de apoio à retracção da actividade e que será, portanto, já tivemos o anúncio da Senhora Ministra do Ambiente e Energia, que será o Fundo Ambiental a suportar este mecanismo.
E temos, paralelamente, estamos a desenvolver um processo de reestruturação do sector da pesca, que implica também alguma reestruturação na frota e que irá auxiliar a diversificação da actividade de pesca, de artes de pesca mais nocivas por outras menos nocivas. E, eventualmente, a redução de algum esforço de pesca e canalizar alguns dos profissionais da pesca para outras actividades marítimas que possam ser acomodadas e de facto continuarem na economia do mar, mas possam ser de facto canalizados para outras actividades não extractivas.
Os Açores são a única parcela do território português que, no caso, avançam nesta meta com esta área marinha protegida do Atlântico Norte ?
Posso falar é da nossa parte: o nosso objectivo, e o que é que nos fez seguir este caminho. Porque, de facto, os Açores acreditam que Regiões ultraperiféricas, regiões insulares, por dependerem sobretudo do mar e por, no caso dos Açores, a dimensão marítima portuguesa deve-se muito aos Açores. E achamos que devemos liderar enquanto região pelo exemplo e portanto, mais do que um plano de acção, mais do que um compromisso, Os Açores, neste momento, nesta semana da COP, trazem uma acção concretizada e esperamos que isto possa ser um exemplo a seguir. Estarmos aqui a trilhar um caminho que pode ser copiado, que possa ser seguido por outras regiões a nível nacional [português], a nível europeu e a nível internacional. Portanto, esse é o nosso contributo.